Nosso décimo primeiro evento (15/04) da turnê falando de Kasa Invisível e realizando o lançamento do livro “Casa Encantada” foi na cidade alemã de Hamburgo. A cidade tem uma forte tradição antifascista e também de ocupações, inclusive sendo palco da resistência dos Autonomen, que na década de 80 conseguiram impedir o despejo das okupas de Hafenstrasse resistindo e enfrentando a polícia. Falamos no famoso bairro de St. Pauli, berço do famoso time de futebol antifascista.
Em Hamburgo realizamos nossa atividade na Incito, infoshop e livraria. O espaço começou em agosto de 2020 e antes era um grupo de anarquistas vendendo livros e zines e revistas na rua, em atividades e shows. Este núcleo realizava atividades em outros locais, até decidiram autogerir o próprio espaço. Conforme nos foi relatado, há muitos espaços de esquerda e anarquistas na cidade, porém o coletivo queria um espaço anarquista, mas aberto também para não anarquistas. Uma constante nessa turnê tem sido ver diversos grupos, assim como a Kasa Invisível, analisando e criticando os limites das subculturas e ideologias. A Incito tem aberto suas portas 3 vezes na semana e sua organização se dá por meio de uma assembleia mensal. O espaço é aberto também para as pessoas do bairro e para as ocupações no entorno.
A Incito vende seus livros sem preço fixo, seguindo o princípio de quem tem mais paga mais. De fato, em nossas conversas, trata-se de um experimento que pode operar também pelo Estado de Bem-Estar Social, que permite que as pessoas vivam com o mínimo de dignidade sem precisar lucrar com o espaço. Muitas questões sobre isso vêm surgindo nessa viagem!
Outra questão que nos chamou atenção é que como uma cidade com tamanha tradição antifascista é extremamente anti-deutsch, com diversos adesivos pró-Israel colocados por grupos antifa. É possivelmente a cidade que passamos até aqui onde isso mais ficou evidente.
No único dia que (infelizmente) passamos na cidade ficamos alojados no Gängeviertel, uma ocupação de um grande quarteirão histórico de Hamburgo. Um antigo bairro judeu, mas que durante a II Guerra foi ocupado por nazistas. Atualmente legalizado em quase toda sua extensão, o espaço impressiona com suas três galerias de arte, loja grátis, bares, cafeterias, cooperativa de comida, sex-shop feminista e livraria, além de espaços para shows, um prédio que conta com espaço para jogos, espaço para reuniões de outros coletivos, duas boates, espaço para tatuagem. Além disso, o quarteirão conta com moradias sociais e que estão sendo reformadas com o dinheiro do Estado por se tratarem de imóveis históricos – quem dera tivéssemos essa sorte! O único espaço não legalizado é o espaço que recebe e abriga ativistas e bandas, um pequeno prédio no centro do quarteirão. Ainda que seja importante as diversas críticas ao espaço por seu caráter iminentemente artístico e que abre espaço para processos gentrificadores, demonstra como a luta efetivamente pode arrancar vitórias.
Queremos agradecer a todes do Incito e do albergue do Gängeviertel, muito obrigado!